terça-feira, 1 de novembro de 2011

Consciência negra - I

       A consciência  afrodescendente, que me acompanha durante 364 dias é "exaltada oficialmente" no dia 20 deste mês que se inicia. Essa data, que homenageia Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra no país, faz parte do calendário desde o final da década de 70, quando os movimentos sociais começaram a ressignificar o movimento negro. A partir de então, foi necessariamente enfatizada a ancestralidade dos valores civilizatórios africanos que, por força da socialização etnocêntrica foram deixados de lado por tanto tempo. 
     Desde então, uma série de políticas públicas vêm sendo adotadas em todas os segmentos da sociedade brasileira, principalmente na educação, com objetivo de combater o preconceito e a discriminação racial no Brasil.
    Com lei 10.639/2003, que prevê a obrigatoriedade do ensino de História da África e da Cultura afro-descendente no ensino, o currículo escolar, na sua totalidade e, em particular(para o caso deste blog) a literatura, necessita de um outro olhar. Um olhar que seja capaz de perceber, respeitar e valorizar as especificidades étnicas da comunidade escolar. Os alunos e suas famílias, professores, servidores, direção, coordenação, ...- precisam reconhecer suas origens culturais no ambiente escolar. 
     Que dizer, então, do livro didático?
     Que dizer da Literatura?
    Que dizer de Machado de Assis (a quem o nome deste blog homenageia), escritor afro-descendente que teve sua origem racial "ignorada" (não esquecer o recente comercial da Caixa Econômica Federal)? 
   Que dizer de Luiz Gama, Solano Trindade, Cruz e Souza, Lima Barreto, Auta de Souza, José do Patrocínio?
Luiz Gama 
Ainda, que dizer de todos os outros dos quais nunca ouvimos falar (e jamais ouviremos ou leremos nada por eles escrito) porque tiveram suas  vozes abafadas devido a cor de sua pele? Isso pra ficar  só na Literatura. 
    Então, em nome da consciência de pertencimento étnico-racial que durante muito tempo esteve à sombra do "mito da democracia racial", o   Ideias de Canário, neste mês (e todos os outros também), dedica suas postagens a alguns desses escritores e suas obras.
Até breve, amigos.
Cármen Machado.


Luiz Gama, 1830-1882


A bodarrada

Quem Sou Eu?
O que sou e como penso, 
Aqui vai com todo o senso,
Posto que já veja irados
Muitos lorpas enfunados,
Vomitando maldições
Contra as minhas reflexões.
Eu bem sei que sou qual Grilo
De maçante e mau estilo; 

E que os homens poderosos 
Desta arenga receosos, 
Hão de chamar-me tarelo, 
Bode, negro, Mongibelo; 
Porém eu, que não me abalo, 
Vou tangendo o meu badalo 
Com repique impertinente, 
Pondo a trote muita gente. 
Se negro sou, ou sou bode, 
Pouca importa. O que isto pode? 
Bodes há de toda a casta, 
Pois que a espécie é muita vasta... 
Há cinzentos, há rajados, 
Baios, pampas e malhados, 
Bodes negros, bodes brancos, 
E, sejamos todos francos, 
Uns plebeus, e outros nobres, 
Bodes ricos, bodes pobres, 
Bodes sábios, importantes, 
E também alguns tratantes... 
Aqui, nesta boa terra, 
Marram todos, tudo berra; 
Nobres Condes e Duquesas, 
Ricas Damas e Marquesas, 
Deputados, senadores, 
Gentis-homens, vereadores; 
Belas Damas emproadas, 
De nobreza empantufadas; 
Repimpados principotes, 
Orgulhosos fidalgotes, 
Frades, Bispos, Cardeais, 
Fanfarrões imperiais. 
Gentes pobres, nobres gentes, 
Em todos há meus parentes. 
Entre a brava militança 
Fulge e brilha alta bodança; 
Guardas, Cabos, Furriéis, 
Brigadeiros, Coronéis, 
Destemidos Marechais, 
Rutilantes Generais, 
Capitães de mar e guerra, 
— Tudo marra, tudo berra — 

     (...)

 Primeiras trovas burlescas de Getulino (1861). 



 Outras Referências:
http://f5.folha.uol.com.br/televisao/988689-caixa-refaz-propaganda-e-mostra-machado-de-assis-mulato.shtml
http://pt.wikipedia.org/wiki/Luiz_gama
http://institutoluizgama.org.br/portal/
http://www.njobs.com.br/seppir/pt/
http://www.seppir.gov.br/

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